quinta-feira, 19 de junho de 2014

Rebolar

Ora quando pensei em rebolar lembrei-me de três conceitos e histórias que se completam em sentido. 

A Dona Constança é uma senhora gorda. Anafada, inchada ou de cara bolachuda, como os mais simpáticos elogios a descrevem. Sua marcha é rebolenta, sendo que dá tempo para que cada peça da sua carne se movimente circularmente até achar novo local. Geralmente, são grandes as cambalhotas de seus músculos e, de forma tão regular que, a cada passada, um movimento inteiro se completa. Como se ela própria fosse uma parte unificadora de partes que rebolam.

Depois há o outro conceito do rebolar, nas palavras que tendem a não sair da boca. Diria que as mastigamos quando, no fundo, o que é mastigado é engolido ou regurgitado. Tudo o que rebola, tem vida própria e pode ou não querer atingir um fim. A bola não segue caminhando a direito, a bola revolve sob seu próprio eixo (propriedade sortuda dos esféricos) e avança no seu caminho, rebolando.

E lembrei-me do rebolar a rir e, em como as convulsões de uma gargalhada sincera nos fazem vibrar arritmadamente como um boneco em anaerobiose. Como daquela vez, na praia, em que as três fazíamos ginástica, ou inventávamos formas de o fazer. E heis se não quando, a minha mão escorrega, a minha cabeça encontra um joelho em vez de se manter no ar, e toda a estrutura se destrói. A foto para que posávamos fica, ela própria, a rebolar a rir, captando enfim algo que as outras câmaras por certo invejam, um momento rebolado de puro riso amizal. 

Assim, tal como as partes que a contêm e envolvem, a história retorna ao ponto de partida sem sentido. Sabe, contudo, que rebolando progride na vida, por vezes retornando ao mesmo local, mas sempre seguindo em frente. Onde quer que isso a leve.



[Escrito a propósito de uma palavra]

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