segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

O poder contagiante

A alegria e motivação alheias são contagiantes. A boa disposição, os sorrisos também.
Contagiantes também são os sentimentos negativos, a tristeza, a desmotivação, a refilice e a cara fechada. São, dependendo da pessoa que os sente e da(s) pessoa(s) que os ressente(m).
O meu conselho, e que bom é, com o simples intuito de que não sejam corridos riscos, trazer sempre connosco na vida as pessoas do primeiro tipo (ou que se esforçam pela inclusão do optimismo na vida) e que sejamos também assim. Um sorriso puxa outro e com pequenos esgares de felicidade trazemos um mundo de alegria no coração.
A todos um bom Natal.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Prendas

1. Como saber se alguém adorou uma prenda:
  • Sorriu?
  • Rodou nas mãos, olhando-a de vários ângulos?
  • Experimentou-a?
  • Sem se mencionar mais a presença do objeto, pegou-lhe no dia seguinte a tentar inclui-lo no seu dia?
Se respondeu sim à maioria destas perguntas, tem um presente bem desenhado.







quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Ana, a louca

Ana era louca. Ana, a louca.
Ana vivia noutra dimensão e não esta, jamais esta. Já não esta. Optara assim, quando ainda a mente a deixava optar. Quando se esqueceu desta dimensão, já não podia escolher nada. Ou o que entendemos por escolher.

Ana, a louca, era a mulher do coronel. Casara-se jovem, como quem bem casado pela igreja o faz. Casara-se quando não sabia o que era um homem, ainda que agora lhe tenha retornado essa ignorância.

Esquecer. Esquecer. Quiçá o que a tornara louca era aquilo que escolhera não recordar. Quando as memórias se misturam, e se optam por esquecer umas, as que estão emaranhadas também se podem sumir. Ana, a louca, esqueceu demasiadas memórias emaranhadas em outras até se esquecer de si. A loucura consumiu-a, deixando-a só louca. Nem mulher de coronel, nem outro tipo de mulher, só a louca, como se outro adjectivo de si se desprendesse. Ana, a louca, fica só também.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

"Impossível é não viver"

"Se te quiserem convencer de que é impossível, diz-lhes que impossível é ficares calado, impossível é não teres voz. Temos direito a viver. Acreditamos nessa certeza com todas as forças do nosso corpo e, mais ainda, com todas as forças da nossa vontade. Viver é um verbo enorme, longo. Acreditamos em todo o seu tamanho, não prescindimos de um único passo do seu/nosso caminho.

Sabemos bem que é inútil resmungar contra o ecrã do telejornal. O vidro não responde. Por isso, temos outros planos. Temos voz, tantas vozes; temos rosto, tantos rostos. As ruas hão-de receber-nos, serão pequenas para nós. Sabemos formar marés, correntes. Sabemos também que nunca nos foi oferecido nada. Cada conquista foi ganha milímetro a milímetro. Antes de estar à vista de toda a gente, prática e concreta, era sempre impossível, mas viver é acreditar. Temos direito à esperança. Esta vida pertence-nos.

Além disso, é magnífico estragar a festa aos poderosos. É divertido, saudável, faz bem à pele. Quando eles pensam que já nos distribuíram um lugar, que já está tudo decidido, que nos compraram com falinhas mansas e autocolantes, mostramos-lhes que sabemos gritar. Envergonhamo-los como as crianças de cinco anos envergonham os pais na fila do supermercado. Com a diferença grande de não sermos crianças de cinco anos e com a diferença imensa de eles não serem nossos pais porque os nossos pais, há quase quatro décadas atrás, tiveram de livrar-se dos pais deles. Ou, pelo menos, tentaram.

O único impossível é o que julgarmos que não somos capazes de construir. Temos mãos e um número sem fim de habilidades que podemos fazer com elas. Nenhum desses truques é deixá-las cair ao longo do corpo, guardá-las nos bolsos, estendê-las à caridade. Por isso, não vamos pedir, vamos exigir. Havemos de repetir as vezes que forem necessárias: temos direito a viver. Nunca duvidámos de que somos muito maiores do que o nosso currículo, o nosso tempo não é um contrato a prazo, não há recibos verdes capazes de contabilizar aquilo que valemos.

Vida, se nos estás a ouvir, sabe que caminhamos na tua direcção. A nossa liberdade cresce ao acreditarmos e nós crescemos com ela e tu, vida, cresces também. Se te quiserem convencer, vida, de que é impossível, diz-lhe que vamos todos em teu resgate, faremos o que for preciso e diz-lhes que impossível é negarem-te, camuflarem-te com números, diz-lhes que impossível é não teres voz."

José Luís Peixoto, in 'Abraço'