quinta-feira, 3 de março de 2016

#01 de rompante

Quando chegaste foi de rompante, o teu corpo forçando a porta e substituindo-a na separação entre mim e o mundo fora dela. Trazias contigo a réstia de vida que existia. Estavas impregnado no teu perfume suave ou o meu olfacto retornou a este cheiro sem realmente o sentir.
Quando chegaste o teu corpo pareceu-me difuso, como se fosse feito de fumo, mas o teu rosto estava determinado e assustado. Foi neste rosto familiar que li que eu fora longe de mais e, que a fúria e o medo te consumiam internamente enquanto eu me consumia fisicamente.
E sorri, porque é sempre bom encontrar-te, continuas a ser o meu rosto favorito. A fala tropeçou-me na tosse e nada te pude dizer. Devia parecer-te tão tonta... Sentada impotente numa sala laranja ardente com um fio de fogo a soltar-se dos fósforos das minhas mãos caídas. Tão tonta e desamparada.
Quando chegaste, soube-me condenada à vida de loucura que se ia anunciando ultimamente no meu olhar, como me dizias, e nas minhas mãos queimadas que agora vias. Soube que não ias acreditar que só queria ver o fogo bruxulear fora da minha mente e não que todo o quarto pegasse fogo e se tornasse cinzas comigo dentro.
Quando chegaste, soube-me presa porque era esta a loucura que não toleravas: a de a mim te retirar de ti; a que o fogo que me corria dentro me queimasse o corpo e o apartasse da alma.
Pegaste em mim e tiraste-me do meu sonho, abandonando-me o corpo no primeiro hospital. “A última salvação de uma alma perdida é a do amor eterno.”
Quando chegaste, soube (ainda sei) que nunca mais te verei neste local louco onde de mãos mais atadas nunca mais atentarei.
Sei também que o fogo viverá para sempre apenas dentro de mim.

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