quarta-feira, 9 de março de 2016

#02 Alfredo, o pinga-amor

Alfredo é um pinga-amor que voa de flor em flor no seu voo lento e gabarolas que procura a mais suculenta de todas. Quando lhe chega o odor ao nariz de uma doce pétala, faz pontaria e aterra devagar.
É sempre um cavalheiro na sua abordagem de amor, pelo que se apresenta, explica as suas intenções fazendo uso de uma pequena canção, até porque acredita que os seus dotes musicais renderão ao seu beijo até as mais desconfiadas donzelas. E, invariavelmente tem a sua permissão para roubar à mais bela flor o seu delicado pólen para poder manter a sua posição de abelha mais produtiva da colmeia, aquela que encontra sempre néctares ímpares. 
Vivia Alfredo, a abelha de maiores asas do bando, com a confiança de um imortal, quando um dia uma dor lhe acode nas costas e lhe faz derramar todo o seu pólen sobre a relva. Tem de fazer uma aterragem de emergência na pétala mais próxima, porque o seu voo ficou descontrolado com o medo. Que dor é esta que lhe aflige até os pelos? Ao ver o seu reflexo numa pequena gota de orvalho verifica que uma ferida se abre entre as suas asas de onde sangue jorra. Abre e expande enquanto Alfredo olha e parece não se controlar. Alfredo recorda que já tinha ouvido relatos de abelhas que se enchem de autoconfiança de tal forma que o próprio corpo se desfaz de arrogância. Então relembra-se que o pólen é muito peganhoso e, pronto, lá vai a abelha esfregar-se no pólen, não contando que as asas também ficariam comprometidas neste processo…

Hoje em dia, Alfredo, já mais idoso, enverga o seu cargo de ancião de asa única, ensina composição de música a abelhas-cavalheiras mais jovens para se engalarem das flores. 

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